sexta-feira, dezembro 29, 2006

Recortes Natalícios II

Homilia rejeitada pelo sim e pelo não

JN

Ivete Carneiro*

Comparar a interrupção voluntária da gravidez (IVG) com o abandono de crianças na Roda dos mosteiros na Idade Média é "comparar o incomparável". A reacção à imagem usada ontem de manhã pelo substituto do bispo do Porto, na sua homilia de Natal, não se fez esperar e foi inesperadamente unânime. Nem os defensores da despenalização do aborto, nem os movimentos pró-vida aceitam a comparação.

Lembrando que "ninguém pode dispor da vida própria e muito menos da vida alheia", D. João Miranda referiu-se ao "período que aí vem de escolha da vida das crianças por nascer" - o referendo sobre despenalização do aborto, a 11 de Fevereiro - a um regresso "ao tempo dos 'expostos', dos meninos da Roda dos mosteiros da Idade Média", onde eram abandonadas as crianças indesejadas. "Todas as interrupções naturais ou provocadas são actos prematuros e imaturos", considerou o prelado, que substitui o Bispo do Porto, D. Armindo Lopes Coelho, internado na sequência de um acidente vascular cerebral.

"É comparar nada com nada. As crianças da Roda eram crianças que nasciam. Quanto muito são comparáveis às crianças institucionalizadas, às que hoje são abandonadas nos hospitais. No referendo, o que está em causa é a interrupção da gravidez numa fase precoce", reage Duarte Vilar, do Movimento Cidadania e Responsabilidade pelo Sim. O também presidente da Associação para o Planeamento da Família aproveita para lamentar o aproveitamento do Natal - "festa que não é só dos crentes" - para exprimir posições.

Uma interpretação a que se junta Maria José Magalhães, do mesmo movimento pela despenalização, para quem D. João Miranda comparou "o incomparável". O embrião, diz, "ainda não é vida humana", não havendo na IVG lugar a qualquer abandono.

Do seu lado, Madalena Simas, da associação Mulheres em Acção, defensora do "Não" no referendo, entende a Roda dos meninos como "uma maneira de dizer sim à vida". Um pouco como a actual adopção, em que a criança é "salva, viveu, não foi abortada".

Mas, independentemente das interpretações, entende António Pinheiro Torres, da Plataforma "Não Obrigado", "tudo o que seja um alerta para o atentado contra a vida é de saudar", pelo que as afirmações de D. João Miranda são "bem vindas". Tais como as do cardeal patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, que aproveitou a mensagem de Natal dedicada à exclusão para considerar que o aborto, tenha os motivos que tiver, "é sempre negar um lugar a um ser humano".

* Com Lusa

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